quinta-feira, 5 de novembro de 2020

O problema foi estar embriagado e sequer ter bebido.

Lembro como se fosse agora, atravessei um furacão de sensações, descoberto, sem uma fina linha de tecido pra não ser rasgado de ponta a ponta por tudo que se é possível sentir. Prefiro tecido à armaduras, essas outras pesam e me protegem. Aqui é sobre estar destemido, correr descalço em solo ungido. Escutar bem altivo que a próxima estação é a sua e decidir continuar vagando, sabendo seu rumo mas escolhendo seguir em frente, você sabe pra onde vai, você sabe o que quer e escolhe não saber pra onde está indo. Sem titubear, sem duvidar das forças celestiais que regem seu destino. O amor pra além do que essas palavras podem descrever, eu sinto. Tudo que pode caber, na imensurável dimensão produzida por um só riso. São olhares os portais pra esse abismo, o abissal cósmico de sentir-se amado pelos olhos, boca e ouvido. Amado pela pele, por cada poro, por cada caminho que o toque pode percorrer. Amado pelas brechas entre as falas que sempre pode caber um beijinho. Amado pelo carinho, feito minuciosamente pela ponta dos dedos, afagos cansados de exigirem sentido, movem-se, sem objetivo. Por algo assim, parecia que eu tava torpe, era um gosto bom, um som gostoso, tava tudo sempre tão cheiroso. Parecia que tudo tava sempre tão cheiroso.

terça-feira, 3 de novembro de 2020

Preciosa

começamos cedo
quiçá antes do que devia
logo ficamos entrosados 
desde então afastamos a separação 

aos finais de semana o encaixe era perfeito
e suas diversas formas valiam a adaptação
durante a semana nos víamos as vezes
talvez sem a mesma empolgação

as vezes, loira como os cabelos das princesas
outrora pretinha como o líquido que é seu antídoto
te aceito te todos os jeitos
assumo o compromisso

sob o sol forte nossa relação aflora
tal poder de esfriar situações quando a cabeça era quente  
sozinhos éramos felizes 
e entre amigos demonstrava sintonia

descrente de amores a primeira vista 
até ver aquela vista
de diferente formas e feições
sempre na perfeita medida das mãos.

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Sinto que minhas palavras estão acabando.

Sinto que minhas palavras estão acabando. Como terminar uma garrafa de água, daquelas compradas na praça, se procurar legal paga um real e reclama que encheram ela na bica de casa. Tá acabando a água que mata minha sede. O vinho que elucida minha loucura, a cerveja que emana energia e remove juízo. Tem dias que, como muitos acreditam, como a terra, eu queria planar. Voar pelo universo e esquecer que a terra não é plana, o mundo gira e as coisas voltam, as consequências, escolhas e as palmilhas de sapato secando na varanda, vão se molhar de novo. Sinto que minhas palavras contemplam os danos, a mim, aos demais, a elas, a eles, a todes. Alegorando, alegoriando, alegrando de vez em quando, eu pelo menos, divirto quando me encanto. Enquanto escrevo, escuto bem baixinho do meu coração um canto. É como se eu fosse real, é como se fosse possível acreditar que a terra dá pra servir igual um pano, pra mesa aqui de casa, com a fruteira, os pães, as formiga e tudo mais. Poesia é legal de vez em quando e olha que maravilha, minhas palavras não estão acabando.

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Eu, tu, nós

em ruas sem saídas, olhamos para trás e pensamos o porquê de entrarmos ali
as vezes, sinalizadas com placas, avisos, mas deixamos passar 
nós somos assim, seguimos até olhar para trás e voltar
temos nossos vícios e redundâncias, estamos cientes 
despertam o ócio, estamos doentes
debatemos o divórcio, somos pacientes
somos cães e gatos, gatos e ratos, e ratos mais uma vez
somos cães correndo atrás do próprio rabo
somos exímios trapaceiros de vida própria 
predador e presa, no fim, apenas presas
presas um do outro e sabíamos desde o início, haviam placas e avisos 
somos grandes temporais, e quando vemos, nos tornamos atemporais a frente de nós mesmos 
é por nós, a sós
somos nós dados em madeiras, difícil desamarrar 
mas calma, tudo no seu tempo 
podemos bem nos dar
somos finais de semanas agitados e segundas maçantes 
tal hora encorporamos verões nostálgicos, em outras, noites broxantes 
somos amantes 
somos o erro em que o outro atua
somos teimosos
e sempre entramos na mesma rua.

quinta-feira, 16 de julho de 2020

Cada canto

lendas da Amazônia a configuram
te afirmo, o corpo é um mapa nacional
com rotas sobrepostas entrelinhas

luzes das mais insinuantes a envolvem
cega como fortes faróis em meio a um breu absoluto
lembrara o brilho das noites paulistas
pisa leve e jeito manhoso
a baiana na essência, desfaço o rumo
nos lençóis, quiçá maranhenses, cobri
não que estivesse frio, mas nem esquentei
quente feito o Rio logo vi
esse balanço na cintura, suspeitei
é da gema, sucumbi
e a divindade de Natal, era ela
mesmo nascendo em fevereiro

planejada e desenhada tão bem como a capital
esbanja a prepotência do sul
e no fundo não está errada
pobre português, mal sabe que a terra descoberta
já estava para alguém destinada.

domingo, 5 de julho de 2020

Máscaras azuis na pele preta

Antes do primeiro gole
Que seja dado a mim o primeiro golpe
Exausto, como a explicação que dava pelos fatos
Ex, estamos todos cansados

Do primeiro ao segundo gole
Pra descer do imaginário, a coragem, pra assumir
Render-se, de uma vez aos fatos
Expulsei todos meus invisíveis mercados

O terceiro gole pra revender
As mentiras que navegavam pelo meu barco
Foda isso, de não lembrar das coisas que falo
Melhor parar com a bebida, escurecer-me alguns dados

As pessoas bebem porque querem esquecer
Disseram-me, eu bebo porque quero ter coragem
De viver, de mentir pra mim e de sentir muito
Pois apático, como ombros tensionados, não entendi

Não me foi apresentado, as emoções e os sentir aptos
Isso não é da sua conta, e dessa conta eu mermo pago
É que depois do quarto gole, minhas palavras cabem num frasco
Depois do quinto copo, minha garganta é um fosso raso

Canalha, pois ora um vil palhaço
Entre tantos cantos deste mundo,
Vim parar justo do teu lado
Descaso

A nossa pele além de diferente é um campo minado
Se falhei em tantos modos, em quantos jeitos
Não fui falhado?
Que isso não tome cordas como cadarços

Espaços e tempos, escassos e tensos
Densos, como água em óleo, um sempre sobe
O outro, fica com o que sobrou de espaço

terça-feira, 23 de junho de 2020

Malandro?

mesmo o bom malandro
sabe quando chegou a hora
de baixar a guarda, de baixar a bola
sente por dentro que não tem saída
vê menos os amigos, diminui a bebida
nunca vivenciou, mas já ouvia por aí
até ria dos outros que agiam assim

surgiu pela frente mas era invisível 
pegou o malandro desprevenido
sonso, nem resistiu a voz de prisão
dias atípicos na trajetória do sujeito
de posturado à comer na palma da mão

o rei se vestiu de bobo da corte
e bobo conta pra quem quiser saber 
com sorriso bobo estampado no rosto
bobo é o malandro se não ceder.

quarta-feira, 10 de junho de 2020

Eu lamento pela aranha que pulou no meu carro

Eu lamento pela aranha que pulou no meu carro. Meti o carro no caminho dela e, ela acabou pulando aqui dentro, pensei respeitosamente em removê-la e colocá-la fora do carro, mas fazer isso com o carro em movimento não pareceu uma boa ideia. Vai ficar me fazendo companhia, eu lamento por você, aranha que pulou dentro do meu carro.  De todas as coisas essa semana que vivi, você tem sido a experiência mais terrena que tive. Eu me conectei tanto, com tanta gente, de vários lugares desse planeta, menos com a terra. Conectar né? Ficar acompanhado online pra dizer a verdade, conectar é diferente. Plugar cabos talvez seja conectar também. As palavras se misturam, a gente tenta desembaralhar elas mas no final, como a gente se sente é o que vale pra gente, eu não me senti conectado com ninguém que falei online. É estranho isso. Porque há poucos meses atrás eu preferia até falar com pessoas pelas redes. Eu evitava lidar com olhares e aqueles trejeitos magníficos que só o ser humano é capaz de proporcionar numa conversa. Ao ouvir uma voz, ao perceber um tom e acompanhar a sua risada quando termina de falar algo que, você acreditava ser engraçado mas ficou inseguro de que sua xapa fosse entender então puxou aquela, aquela risadinha solicitando que fosse acompanhado na risadinha, pra que seu comentário engraçado fizesse sentido e você não se sentisse bobo. Mas a pessoa não riu. Porque na internet isso não afeta muito a gente né. Eu nem preciso mostrar o rosto mais. As vezes acho que virei minha foto de perfil. Um arquivo em .png de 128 pixels de largura e de altura, colorido mas sem muitas cores na verdade. Até que eu pareço bonito nesse arquivo. Será que as pessoas lembram de como eu sou agora? Se não lembrarem também tudo bem, tudo que eu lembro agora é que lamento pela aranha que pulou no meu carro. Queria lembrar de mais algumas coisas, mas parece que esse momento tá sendo tão gostoso, alguma coisa me diz pra deixar pra pensar nisso tudo depois, vou me concentrar aqui com essa aranha que pulou no meu carro.

quarta-feira, 3 de junho de 2020

Carta ao passado

poucas coisas mudaram, meu velho
o mundo anda de cabeça para baixo
e sem perspectiva de mudança

preocupa a estupidez vencer 
parece que teu sofrimento foi em vão
nem tão libertos estamos
algemas ainda nos amedrontam
logo na era da informação

a indiferença ainda circula por nós
a ignorância assombra nossos dias
pelo visto não leram os tais livros
aqueles que dizia ser teus falsos diários
os algozes ainda são os mesmos
estiveram maquiados por algum tempo

recentemente optaram pela transparência
tudo desandou, bem que o senhor avisou
o medo está amarrado em nossas sombras
a justiça tarda e falha do lado de cá
os monstros da noite nunca foram tão reais
quanto tempo faz, cem anos ou mais?
perdão por tão tarde 
com essa carta te incomodar 
preto, tu sabes o quanto é difícil ouvirem a gente por aqui
Boa noite.

quinta-feira, 28 de maio de 2020

Quando escapuliu por vaidade, esqueci de verdade, a mente.

A gente dança com o que dança com a gente.
Agentes agem conformem agem-se gentes.
Ai gente! A vida nem sempre é condescendente.
Perdoamos tantos deslizes pra sermos sempre incoerentes.

Inconsistente como olhar a palma das mãos pra comprovar que tu não soltou. Provar pro mundo, implorar aprovação. Dizendo, não fui eu, olha aqui, a mão não tá amarela. Patético. Como toda a estética de um romance dialético, previsível, talvez por isso harmônico, quem sabe até bonitamente poético. É estético. Eu defino do meu jeito aquelas coisas que não entendo, um tanto quanto biflexo. Diz-se sobre o léxico, o amor que cabe em gavetas, explode mundos e planetas em alguns contos sci-fi dos serviços de assinatura cibernéticos. Quero tá sempre sendo eclético, amar como Gandhi, amar como Sant, amar como quarenta e cinco pessoas numa fila pra sentir a deglutição de uma quantidade exótica de batatas sintéticas. Volto aqui pra dentro do quarto, dentro do meu peito, de baixo do ventilador de teto. Devoto a encontrar qualquer coisa que me faça gostar menos das lembranças de passar um tempo com você.

quarta-feira, 27 de maio de 2020

Sorte

é do abraço estreito que digo
a gargalhada que conforta
o ombro amigo trajado de abrigo
quem nunca te fecha a porta 

quem te enaltece sem hesitar
em seguida, um berro de repreensão
feito carne e unha, não abro mão
laços afetivos tecem um par
ímpar, guia um dom consigo
faz as terças lembrarem domingos 

copo cheio lota o nosso tempo de histórias
falas e dizeres, surgem sem cessar tagarela
tua sombra presencia as melhores memórias
águas bravas, mar aberto, incapaz de travar
mas se faz maré mansa, água rasa para amparar

abastecido de amor, agradeço
dito linhas versadas de gratidão
se tudo na vida tem um preço
não está a venda essa união. 

segunda-feira, 25 de maio de 2020

Cumba

Tenho estado tão triste
Explorar os poderes do coração é definitivamente fascinante. Uma das coisas mais corajosas que já fiz. Cada dia a mais olhando pra dentro é um dia menos olhando pra fora, entendendo as conexões feitas com o tempo, respeitando mais dos processos, da história.

Eu tenho estado tão triste.
A ponto de ir toda noite olhar lá pra fora, na esperança de te ver voltar. Passar pedalando me vendo de longe e desviar pra não me encontrar. As vezes deve achar que não te vi, as vezes te vi mas me escondi pra você se aliviar.

A tristeza se vai, agora a raiva em riste.
Como num mapa astral, esse era meu signo. Fadado a perseguir os seus deslizes. Contrapus isso com meus erros e minhas barganhas com o mundo que antes sempre via por um olhar triste.

Eu não entendo porque ela insiste.
Por ela eu ando, por ela eu penso, por ela meus medos tão sempre vivos pra me lembrar do porque tenho preterido ter desistido. Por você estico o tempo, pra chegar o dia em que eu desisto.

segunda-feira, 18 de maio de 2020

Paciente

saudades dos risos contagiosos
faz falta aquela mesa de quatro lugares
a pelada mesmo em dias chuvosos
a noite e as trocas de olhares 

ver meu time jogar aos domingos 
o copo erguido em homenagem aos amigos 
a menina que gosto sorrindo
olhar daquela pedra o sol fugindo

tardes ensolaradas em águas salgadas
filmes em salas geladas 
dinheiro gasto de forma exagerada 
bebidas e a fatídica ressaca

sexta-feira ansiar por chegar em casa
na segunda reclamar da semana se abrindo
se fosse um pássaro, arrancaram as asas
condenado ao trancafiamento no ninho
são tempos delirantes de dias repetidos.

quarta-feira, 6 de maio de 2020

Foliã

As ruas presenciavam a  mais nobre foliã
brilhos que atraem e centralizam a atenção
desfilava sem a preocupação do amanhã
pés guiados pelos passos da multidão

Camuflou a pele com purpurina

as cores do arco-íris beijavam o chão
no asfalto do Rio era história sendo escrita 
sem quarta feira para cremação

E de meu corpo fez passarela

fatalmente é um enredo soberano a passar
entre notas artísticas, a alegoria mais bela 
dos jurados veio o dez sem titubear

Luzes da cidade espelham seus paetês

que mais pareciam um feito natural
dias que poderiam transbordar o mês
ou todo mês transbordar carnaval.

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Por que existem lembranças ruins?

Dando o papo mais do que reto sobre
Sinto que andei mais do que torto e pútrido
Mais do que sórdido, lúcido
E Lúcia, eu nunca te falei isso mas sempre foi tudo podre

As lembranças que mais do que lambanças
Foram públicas as finanças
Transparentes, sólidas e as cobras
Cuidaram de tudo, até das mudanças

Premissas boas a gente se deu, não foi?
Um eterno amor de fim de semana
Dolce&Gabbana mais barato que prédios
Isto, os prédios mais caros de Copacabana

Como pode lembranças ruins,
Tudo que sinto é tão bacana
Seu olhar boludo mirando pra cima da cama
A cabeça não sei onde mas encostada em mim

Eu queria dizer que te ama
E que podia tudo parar numa casca de nóz
O universo inteiro num átomo
Quem sabe um colchão numa cama de nós?

Tomo calma pra não beber do tédio
Leio a paciência das fotos que posta
Não me prometendo nada,
Enquanto me permito sentir tudo

Um orgulho tão exagerado aqui sabe,
Se eu pudesse transformava tudo em dinheiro
E saía comprando/distribuindo comida por aí
Acabava com a fome do mundo e com essas cores estranhas que habitam assim

terça-feira, 24 de março de 2020

Pra trono, poltrona

- Digo, sentimento não é pra ser negativo
- Pode ser positivo e negativo, pode ser outra coisa
- Pode ser mais o que?
- Eu não sei, pode ser?

Quase sempre explicando os sentidos
Explicando, mentindo, enganando os sentidos
Regime semiaberto, foram 53 dias até aqui
As paixões de titânio convergiram e sucumbi

A cada olhar, muito sorri
Por tantas cores, não entendi
Não precisei, tu sempre soube
Eu me calei, só te ouvi

Cogitei até andar de lambreta,
Chegar mais perto, ignorar a vendeta
As lutas, os braços, tão largos, molengas
Sem querer pisar em ovos, esmaguei todos na gaveta